Por Laura Bing *
Para contar sobre o meu primeiro ano trabalhando na NOZ, preciso primeiro contar sobre como eu cheguei aqui. Minha primeira formação, ou uma primeira tentativa disso, foi na graduação de Relações Públicas. Após algumas vivências na área corporativa, e novamente, primeiras tentativas disso também, percebi que meu apetite era por outras formas de trabalho. Foi na graduação de Relações Públicas que tive meu primeiro contato com a Sociologia e a Antropologia, fiquei fascinada, mas como tudo que gera fascínio, também fiquei espantada. Eu não imaginava que existia um estudo que se ocupa de estudar as relações humanas e com tanta variedade de assuntos, como as artes, a alimentação, os hábitos, as instituições, o trabalho, a religião, etc.
Decidi largar a graduação de Relações Públicas, na época eu achei que gostaria de ser assistente social mas por um caminho lateral eu cheguei nas Ciências Sociais. Elaborei que era ali que eu poderia fazer algo que é igualmente importante quanto a execução prática das quais os trabalhos normalmente se ocupam, mas que é o estudo teórico, analítico e crítico da sociedade. Resumindo uma série de idas e vindas da minha formação, acabei encontrando um trabalho que foi demasiadamente teórico, porém pouco prático.
Trabalhar com pesquisa é um desafio em toda a amplitude do que a pesquisa se propõe: desde a formação de pesquisadores no Brasil, das condições sócio-econômicas - principalmente do ambiente escolar a familiar como cenários - para garantir o nascimento de um pesquisador, sem falar nas viabilidades de financiamento nacional para garantir a sobrevivência e, mais, a retenção de pesquisadores brasileiros - fato que chamam curiosamente de “fuga de cérebros” no meio da pesquisa acadêmica. Mas, claro, falar de pesquisa é compreender uma miríade de meios e fins dessa função.
No caso das pesquisas para fins privados, metiê da NOZ Inteligência, também é um desafio pois haver recursos não significa necessariamente que haja planejamento para que isso seja investido. É um desafio no Brasil que a pesquisa seja compreendida como desenvolvimento e tecnologia, ainda que estejamos falando de relações humanas, pois no fundo estamos falando de avanços e movimentos dentro de determinada instituição. Tecnologia não significa apenas maquinário, mas também um conjunto de técnicas e metodologias para aperfeiçoamento do trabalho humano. Como eu disse inicialmente, na formação acabei encontrando um modo de fazer as coisas que passa muito pela via teórica e analítica, o que não quer dizer que isso seja mais ou menos do que um trabalho de execução. E é um desafio compreender que análise não existe sem o motivo de uma execução, e vice-versa.
A busca pela NOZ se deu por compreender que o trabalho já existente ali mostrava ser muito rigoroso na compreensão analítica, mas que buscava apresentar e expor os dados e as análises de forma clara, acessível e democrática. E essa é uma das minhas grandes críticas à pesquisa de uma forma geral, principalmente na formação acadêmica de pesquisadores, pois a descoberta e a transmissão de conhecimento devem estar ao alcance de todos. Um trabalho bem apreendido e bem apresentado não precisam ser necessariamente enigmáticos ou sinuosos na linguagem. Guardemos os enigmas para as perguntas de uma pesquisa, não para as suas respostas.
Um dos grandes desafios que tivemos nesse último ano, na minha perspectiva, foi nos depararmos com outro tipo de democratização no acesso à informação: a acessibilidade. Encaramos um projeto grande, em todos os sentidos, de pesquisar as vivências no mercado de trabalho por parte de pessoas com diversas deficiências. E claro, nossa preocupação, além de buscar compreender o que queríamos extrair de informações, era como expor o que fosse extraído para pessoas com e sem deficiência. Particularmente, além dos desafios metodológicos da pesquisa, acredito que a maior reverberação do trabalho foi me sensibilizar com o que fomos testemunhando nos relatos e nos dados já existentes sobre o capacitismo, mas especialmente como ele afeta as pessoas com deficiência em relação aos seus trabalhos. E penso que esse foi o nosso grande trabalho, transmitir os dados mas também colocarmos ali por escrito o que nos impressionava e que tanto trocamos ao longo do projeto. Acho que esse é um dos grandes requerimentos para uma equipe pesquisadora: saber onde e como a pesquisa nos toca. Se para algumas áreas ou atividades a capacidade de se sensibilizar com o trabalho é algo a ser contornado, superado, penso que na pesquisa isso é uma ferramenta muito potente a ser utilizada, principalmente sob uma boa coordenação e liderança de projetos e também quando temos interlocução com a equipe.
Ao longo deste um ano trabalhando como pesquisadora na NOZ Inteligência, estive em projetos de educação, de negócios, de saúde, de mercado, empreendedorismo, etc. E todos eles possibilitaram vasculhar e esmiuçar problemas, o que é ótimo, pois o problema é o combustível de uma pesquisa. Foram muitas as trocas e as reuniões em equipe para compreender não o que vamos encontrar numa pesquisa, mas um passo antes: como procurar algo.
Na vivência da NOZ e com a equipe, fui aprendendo a formular problemas, pois fazer pesquisa pode parecer uma busca por respostas, mas o grande jogo está em fazer perguntas. Eu, particularmente, considero que o pesquisador é na verdade um grande “perguntador”. Estar na NOZ é possibilitar que exista e que eu alimente, nas trocas com a equipe, uma perguntadora dentro de mim. Como eu disse na minha tentativa corporativa, eu precisei escutar o meu apetite por outras formas de trabalho e foi na pesquisa que eu encontrei.
*Laura Bing é cientista social formada na FFLCH-USP, com inclinação para a área de sociologia, e também psicanalista e membro do departamento de Formação em Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae. Antes de trabalhar com pesquisa, atuou por cerca de 10 anos na área cultural, em espaços como editoras, orquestras e museus. Além de pesquisadora da NOZ Inteligência, divide seu tempo com clínica particular, lugar onde encontrou o casamento entre a investigação e a inquietação e também em atendimentos à população no coletivo de Clínica aberta de psicanálise, que ocupa espaço na Casa do Povo. Já trabalhou com pesquisas na área de avaliação de políticas públicas e privadas, pesquisas na área ambiental e também em avaliação de impacto de empreendimentos em território de populações tradicionais, como quilombolas e ribeirinhos. Se interessa por questões sociais e de tecer perguntas sobre o impacto que existe sobre o indivíduo.